Contos de Praga, parte 1: o sonho, o acaso e o convite
E o passaporte, claro. Não dá pra viajar sem ele, né.
Ahoj! Esse é um texto que vai falar bastante sobre a República Tcheca, mas a trilha sonora que eu vou colocar aqui é da Mongólia. O The Hu é uma das bandas que mais tenho ouvido nos últimos três anos, pelo menos. O álbum de estreia (e único da banda até agora) é entitulado "The Gereg", que é o nome do primeiro passaporte diplomático de que se tem notícia no mundo, criado pelos mongóis, na época de Genghis Khan. Dê o play na faixa-título The Gereg, cantada em mongol e tocada com instrumentos locais, como todas as músicas deles e vamos juntos, caminhando até o Castelo de Praga.
Prólogo
Brasileiro é daqueles povos cheios de características próprias, do tipo que todo mundo critica, mas sabe que tem um pouquinho dentro de si. Calma, dessa vez, não vou falar de política e corrupção. A questão aqui é mais branda: quem nunca deixou nada para a última hora? Ou, indo além, quem nunca adiou tanto fazer alguma coisa até que ela se tornasse necessária em caráter de urgência?
Eu sabia que, em algum momento da vida, precisaria de um passaporte pra sair do País. Comecei 2015, inclusive, com a sensação de que esse seria o ano para tal, mas não sabia em que momento isso aconteceria. E, bem, aconteceu. Apareceu a tal oportunidade de visitar o velho continente e, em um mês tudo se desenrolou. Fiquei sabendo que ia viajar e dei entrada no passaporte que, após todo o processo, ficaria pronto bem no dia da viagem. Claro, com adrenalina é mais gostoso e lá fui eu na Polícia Federal buscar o dito cujo. Uma hora do lado de fora esperando o serviço se iniciar, um minuto lá dentro — fui o primeiro a ser atendido no setor — e pronto, lá estava eu, autorizado a sair do Brasil.
Peguei o táxi cedo e cheguei com bastante antecedência no aeroporto de Guarulhos, claro, pela imprevisibilidade de São Paulo - demorei 40 minutos de Osasco até lá, mas poderia ter levado três horas. Passeei pelo terminal 2, usei minha uma hora de wi-fi grátis para assistir House of Cards (o espetacular o 4° episódio da terceira temporada, de quando a série era boa e Kevin Spacey não tinha sido denunciado por assédio). Andei até o terminal 3, muito mais novo e bonito do que os outros dois do aeroporto, despachei a mala maior e me sentei para escrever. Em 15 minutos abrir-se-ia o portão de embarque. Allons-y à Paris!
E foi aí que eu parei de escrever, em 14 de maio de 2015, antes de embarcar para a Europa. Meu desejo, então, era escrever cada dia um pouco, para ter um diário de bordo e você acaba de perceber que eu não só não o continuei, como não produzi uma linha de texto sequer em terras europeias. Então, a partir daqui, tudo será um exercício de memória pra contar a história da realização de um sonho: conhecer Praga, na República Tcheca.
Prólogo do prólogo
10 anos antes de embarcar pra Europa, eu comprei uma revista que falava sobre viajar de trem pelo velho continente. Tinha o desejo de fazer um mochilão por lá, coisa que (ainda) não fiz, para conhecer principalmente o leste europeu. Em especial, a República Tcheca. A tal revista tinha uma programação que parecia ser fantástica do que fazer em Praga, com fotos lindas de uma atmosfera medieval.
Fiquei tão encantado que construí um roteiro. Descobri que precisava descer na estação Staromĕstská pra ir na Torre do Relógio e que o Castelo de Praga, Pražský Hrad, era de arquitetura gótica - seja lá o que significava aquilo. E que a Ponte Carlos dava as melhores vistas da cidade, durante a travessia por sobre o rio Vltava. Eu, com todo meu fascínio por idiomas estrangeiros, não me contentei em apenas ler esse caminhão de consoantes e acentos estranhos em lugares aleatórios. Eu precisava aprender a falar aquilo tudo.
Por conta própria, comecei a estudar tcheco, sozinho, pela Internet. Aprendi a contar até 10, os cumprimentos principais (oi, bom dia, obrigado, desculpe) e a pronunciar basicamente qualquer palavra no idioma, pela identificação dos sons existentes. O Ž, em Pražský, por exemplo, tem um som de J bem carregado, enquanto os acentos agudos servem para marcar a duração das vogais (o Y é uma vogal, aliás): vogal com acento é como se fosse dupla. Aos boleiros, Nedvěd lê-se "Nedviéd" e Rosický lê-se "Rositsquii". Parece muito, mas é bem pouco e eu parei com a odisseia de tentar aprender tcheco ao descobrir que a língua tem casos gramaticais: sete formas diferentes de, bem a grosso modo, conjugar substantivos de acordo com a intenção de quem está falando, agregando a preposição ao substantivo. (eu hein.)
Por mais que eu tivesse o sonho, nunca na vida havia me planejado para realizá-lo - nunca tinha ido além do idioma. Educação financeira passou longe (e claro que fez falta) e o mínimo planejamento, também. Coube ao acaso o trampo de fazer essa viagem acontecer.
O convite
Comecei a trabalhar com redes sociais quase que por acaso, em 2012. Eu era um mero usuário, como quase todo mundo na época, e tentava, junto com a galera da firma, entender a dinâmica de funcionamento de um tal Facebook. Fui contratado como assistente de comunicação. Eu sabia que seria um cargo bastante generalista, mas entendia que teria foco em comunicação interna, área da minha experiência anterior, e assessoria de imprensa. O papel de entender melhor e cuidar daquele negócio caiu sobre o meu colo logo na minha primeira semana: a de Páscoa.
Dali pra frente, fui vivendo e aprendendo. Conversas com agências, pós-graduação, muitas leituras, eventos, webinars e tudo o que tive direito. Algum tempo depois, em 2014, contratamos uma ferramenta para nos ajudar no acompanhamento dos dados gerados em nossos canais e fazer comparativos com a concorrência, chamada Socialbakers (hoje, Emplifi). Eu já os "usava" como fonte de conteúdo e aprendizado e passei a ser cliente naquele momento, claro, como representante da firma.
Neste mesmo 2014, em uma dessas rondas por entender melhor o mundo das redes sociais, uma mensagem chegou à minha caixa, com o título "Engage 2014". Era um e-mail marketing para os clientes, oferecendo um desconto para o evento global da empresa, cheio de palestras espetaculares, em Londres. Me interessei, mas, por conta do valor, não rolou. No entanto, ao final deste evento, se me lembro bem, eles já anunciaram a edição do ano seguinte, que seria na capital do país natal do Socialbakers: Praga. Claro que já me enxerguei lá, assistindo ao evento, mas sabia que iria esbarrar novamente no preço, em euros, do ingresso, e em dólar, das passagens aéreas e hotel.
Muita coisa aconteceu - incluindo muito trabalho - entre um Engage e outro. Tivemos conteúdos muito interessantes fazendo bastante barulho na mídia, conseguimos bons números de engajamento, com um investimento de mídia relativamente pequeno para a época e bastante otimizado. Tudo isso chamou a atenção do Socialbakers, que monitora milhões de perfis de redes sociais e tem milhares de clientes mundo afora. Recebemos, pelo êxito em conteúdo, engajamento, investimento e mídia, uma certificação que quase ninguém tinha no mundo, a de Smart Storytellers.
Junto ao e-mail que comunicava que havíamos conseguido essa certificação, veio o convite para que a empresa enviasse um representante ao Engage Prague 2015 para receber o prêmio, no evento principal. Meus olhos brilharam, meu coração bateu mais forte. Era o acaso colocando Praga no meu caminho.
Provavelmente estivéssemos em fevereiro ou março e o evento era em maio. Tive, antes de mais nada, um trabalho de convencimento: eu só tinha os ingressos para os três dias de evento (que valiam mais de 1500 USD na época), dois com workshops conduzidos por executivos de marcas gigantes e agências importantes do mundo inteiro e um de palestras também conduzidas por executivos de marcas gigantes e agências importantes do mundo inteiro. Precisaria que a firma financiasse as passagens de ida e volta e a estadia durante os dias em Praga.
Cotei tudo com um agente de viagens e, quando fui conversar com a chefe, fui surpreendido mais positivamente do que eu imaginava. A empresa realizava, anualmente, uma viagem com franqueados e um grupo pequeno de colaboradores para a Bélgica, para uma imersão no mundo do chocolate. Para 2015, meu nome estava entre os cotados - e a viagem seria em outubro. Tive, então, uma escolha na mesa: Bélgica ou República Tcheca. Escolhi meu sonho de adolescente e ainda "ganhei" a oportunidade de visitar Bruxelas e Paris (que seria outra cidade por onde o tour passaria naquele ano), para vivenciar um pouco o mundo do chocolate.
Só então, após a confirmação de que eu iria mesmo, dei entrada no passaporte. Só com ele eu conseguiria viajar pelo velho continente e deu certo pegá-lo horas antes de embarcar rumo à primeira parte da viagem: 24 horas em Paris. Na sequência, seriam duas noites em Bruxelas e, por fim, cinco dias em Praga.
Na semana que vem, conto a parte europeia da história. Dentre outras coisas, aprendi que olhar para a janela, avistar um monumento e andar em direção é uma ideia maneira, mas pode cansar bastante. E que os europeus não gostavam muito que tirasse fotos das lojas deles.
Beijos de luz e até a próxima,
Luigi"