Contos Europeus, parte 2: eu não vi a Monalisa
Só vi a Torre Eiffel da janela do hotel e tentei andar até ela. Spoiler: não deu muito certo
Nota do autor 1: de volta depois de uma semana de hiato por motivos de: trabalhando bastante. Obrigado pela compreensão.😃
Nota do autor 2: como tem muita história legal até chegar em Praga propriamente dita, mudei o nome da série pra Contos Europeus. Assim, não corro com texto e não perco detalhes das “aventuras”. Hoje, é a primeira parte dos passos no velho continente.
Em 2006, pouco tempo depois de ter terminado um curso de inglês (sim, eu fui até o fim) na Wizard, eu queria um desafio novo. Como o rumo natural de todo mundo era aprender espanhol na sequência, eu quis fazer valer aquela velha máxima de toda mãe de que "você não é todo mundo". Decidi aprender francês. Dá o play aqui na música Paris, da cantora Camille, que ouvi em uma aula ainda no primeiro semestre, e vamos juntos, pra terra da Marselhesa.
Uma bandeira, por favor
Foram dois anos de curso até a minha experiência de um ano (ou quase isso) na Unesp, em Assis. Depois disso, retomei provavelmente em 2009 e em 2011 terminei. No começo, tinha uma escola da Aliança Francesa em Osasco, pertinho de casa, e era muito cômodo ir pra lá numa manhã de sábado. Depois, a unidade fechou e eu fui pulando de unidade em unidade, até que conseguisse terminar o curso equivalente ao B.2, nível intermediário mais alto. Saí confiante de que estava não fluente, mas me virando suficientemente bem.
Ainda assim, não tinha tido uma oportunidade real de testar, a não ser quando a firma recebeu uma visita do cônsul da Bélgica (com uma bela comitiva) no Brasil para uma cerimônia na fábrica. Fui escalado para o time justamente por falar francês e... Não falei uma palavra sequer. O presidente começou a falar com seu inglês meio macarrônico na recepção aos convidados e, minutos depois, o cônsul disse, em português, para que ficasse tranquilo, pois todos os presentes ali o entenderiam bem em nossa língua. E essa foi uma ótima manhã para praticar meu português.
Voltemos ao final do post anterior. Embarquei em Guarulhos, rumo à Paris, mas com escala em Amsterdã, no belo aeroporto de Schipol. As poucas horas ali só me deram tempo de apreciar (com os olhos) cadeiras de massagem que funcionavam com 1 euro e tomar uma bebida (nem tão) local (assim) no Starbucks. Conversei com o moço que atendia por lá e ele escreveu meu nome com sucesso (e com Z) no copo, além de me ensinar que obrigado em holandês era "Dank". Na imigração, eu já tinha tido outro contato humano, ao responder a pergunta que deixa a galera em pânico, emitida pelo policial, em inglês com sotaque pesado: você vai está aqui para trabalho ou turismo?
A segunda perna da viagem foi de KLM, assim como a primeira, mas num avião bem menor, chamado de Cityhopper – era o que estava escrito na lateral dele. Ir de Amsterdã a Paris foi praticamente uma ponte aérea São Paulo - Rio de Janeiro: meia hora de voo. E lá estava eu, no gigantesco Charles de Gaulle. Como bom viajante de primeira, eu não tinha nada preparado ou encaminhado além dos hotéis e traslados. Peguei um táxi, disse o nome do hotel e bora. Já era, ali, a minha primeira oportunidade de gastar os anos de francês – e eu definitivamente não sou de puxar assunto do nada, na vida toda.
Para a aparente surpresa do motorista, questionei, no idioma dele, se o estádio pelo qual havíamos passado era o Stade de France (onde rolou a final da Copa do Mundo de 1998), ele respondeu que sim e pronto, acabou a conversa. No caminho, passei ainda pela bagunçada rotatória do Arco do Triunfo até chegar ao First Hotel, em frente à estação de metrô Cambronne, o que eu descobri só depois.
Cheguei cansado, dizendo que tinha uma reserva em meu nome e a recepcionista, muito simpática, me respondeu sorrindo que estava tudo certo e me indicou onde era o meu quarto. Subi, joguei a mala na cama, abri a janela e vi a Torre Eiffel. Parecia estar perto, mas eu descobri, na prática, que não era tão perto assim. Ali, eu precisava tomar uma decisão: descanso ou já vou conhecer a cidade. Eu iria para Bruxelas no dia seguinte, de trem, no final da tarde. Ignorei o cansaço corporal e fui para a rua, provavelmente sem fones de ouvido, em direção à torre.
Claro, meu caminho não era uma linha reta como aparentava ser na vista da janela. Então, meio que me perdi em pouco menos de uma hora em Paris. O que me norteava era a bússola mental de saber que a torre estava em uma certa direção. Andei até chegar ao Sena, o que me indicaria que eu estava perto do meu destino, certo? Errado. Vi o Sena, sim, e uma pomba francesa me premiou com um cocô. Caiu no meu ombro e foi a primeira vez na vida que aquilo tinha me acontecido. Logo eu, que morei 30 anos da vida em Osasco e, até então, tinha 27 anos contrariando a estatística.
Eu estava na Quai d'Orsay e entrei em um restaurante para tentar me limpar. Pedi à garçonete um "drapeau", quando deveria ter pedido um "serviette". Ou seja, em vez de pedir um guardanapo, pedi uma bandeira. Pela expressão de "ouf, Mon Dieu, Sacre Bleu!", ela entendeu mesmo assim e me premiou com um guardanapo. Saí do restaurante e percebi que estava andando na direção oposta de onde queria chegar. Dei meia-volta, meio cético comigo mesmo, mas consegui chegar no Campo de Marte.
Monalisa ou Memphis?
Imigrantes africanos vendendo chaveiros e miniaturas da torre, zilhões de pessoas e muitos casais tirando fotos usando seus paus de selfie. Eu sentei sozinho por alguns minutos ali, pensando na realização que estava sendo aquele momento, praticamente cinematográfico. Não comprei nada, mas tirei a minha selfie, a primeira de várias que eu tiraria na viagem solo pela Europa. No pé da torre, vi uma fila imensa para subir pelos elevadores e uma fila menor para subir pelas escadas. Escolhi nenhuma das duas e segui o roteiro turístico relâmpago, rumo ao Louvre, de metrô.
Em um sistema parecido com o paulistano, mas com muitas linhas e estações a mais, cheguei em pouco tempo na estação principal que dá acesso ao Louvre. No "subterrâneo", uma galeria com lojas riquíssimas, como uma da Apple, imensa. Na superfície, a famosa entrada em formato de pirâmide foi tudo do que consegui me aproximar pra tirar, claro, uma selfie. Milhares de turistas cercavam e faziam filas para entrar no Museu e eu escolhi não encarar, até porque tinha pouco tempo.
No caminho de volta para o metrô, fui literalmente fisgado por um dos diversos imigrantes vendendo coisas. Memphis era um jamaicano negro, gente finíssima, que vendia pulseiras que ele fazia na hora, amarrando no braço dos turistas enquanto contava algum tipo de história que não lembro, falando palavras em diversos idiomas e tentando adivinhar de onde era o turista em questão. Ele não acreditou que eu era brasileiro, pois respondi em francês ao que ele falava e não era muito comum turistas falarem a língua local. No final, o cumprimentei e paguei cinco euros pela arte (e pela história) - o preço original era 10 e ele disse que malandramente vendia mais caro para americanos.
Minha história com o "Louvre" não envolve fotos tentando pegar a ponta da pirâmide com as mãos, ou um choque com o fato de a Monalisa ser minúscula, mas com um vendedor de pulseiras que teve uma lábia maneira o suficiente pra me fisgar por cinco minutos de conversa.
O pão perdido
Do metrô, desci na Champs-Elysées e novamente, um sentimento pleno de realização me tomou. Atravessando a avenida de um lado a outro por muitas vezes e entrei nas lojas mais bonitas e/ou maiores: Disney, Mercedes Benz, Nike, Citroën, Sephora, Häagen-Dazs e Fnac (saudades). Nessas duas últimas, inclusive, fiz minhas únicas compras no dia: um sorvete e um CD da banda francesa Les Ogres de Barback. A atmosfera é realmente impressionante e a avenida palco de protestos e comemorações é um palco incrível para um consumismo de luxo.
Em uma das últimas travessias que fiz, tive a felicidade de o semáforo fechar quando eu estava bem no canteiro centro, pertinho do Arco do Triunfo e, lá, tirei mais uma selfie, a última do dia. Eram quase 20h e o céu começava a ensaiar escurecer, de maneira que conforme fui chegando perto do Arco, as lojas se fechavam por conta do horário. Nem consegui entrar na Cartier, uma das mais próximas à rotatória do Arco, pra comprar um relogiozinho e fiquei désolé.
Peguei o metrô de volta pro hotel e desci na estação que notei ser mais perto dele, quando saí pra caminhada em direção à Torre Eiffel. Ao chegar no hotel, no entanto, vi que a tal estação Cambronne ficava, literalmente, do outro lado da rua. A pequena caminhada final, de qualquer forma, me permitiu ver que tinha uma praça/rotatória bonitinha, com lugares aparentemente interessantes pro meu primeiro (e único) jantar em Paris até hoje.
Entrei no La Place Café e tive que me esforçar bastante pra lembrar das aulas de francês e acertar o ponto da carne. Do bem para o mal passado, os pontos são: bien cuite, cuite, à point, saignante e bleue. E aqui vai a dica: o "ao ponto" deles é quase o nosso mal passado. O jantar não estava espetacular. Era bem gostoso, mas não tinha nada de surpreendente e incrível. Duas outras coisas me encantaram mais: pedir uma água e ver que a unidade de medida usada pelos franceses é o glorioso centilitro e a sobremesa que pedi, um pain perdu.
Minha escolha foi por ele muito mais pelo nome engraçado - um pão perdido - do que pelo prato em si. O dito cujo nada mais é do que uma rabanada gourmet - assim como o croque-monsieur é um misto quente com grife, cá entre nós. De qualquer forma, estava bem gostoso, pois era servido com uma calda de caramelo bem doce e uma bola de sorvete de creme. Foi uma escolha pra coroar meu primeiro dia em terras europeias. Um dia em que "me perdi" em Paris, fiz um "amigo" jamaicano, fiz visitas relâmpago e tirei selfies com os principais pontos turísticos da cidade, levei um cocô de pombo parisiense (chique) no ombro e pedi uma bandeira pra limpar.
Voltei pro hotel e desenhei o roteiro do segundo dia em Paris, que envolvia um roteiro bem menos turístico e muito mais profissional, focado em lojas de chocolate e varejo em si, em continuidade ao rolezinho varejístico na Champs-Elysées. Mas isso é tema pra parte 3, que também vai trazer o começo de dois dias em território belga e uma verdadeira salada de idiomas estrangeiros na Grand Place de Bruxelas.
Beijos de luz e até a próxima,
Luigi"